ESTUDO REALIZADOS PELO PROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA, ROGÉRIO TADEU ROMANO, ELABORADO EM JANEIRO DE 2015, E PUBLICADO NO BLOG JUS.COM.BR - https://jus.com.br/artigos/35695/os-crimes-contra-o-sentimento-religioso - SOBRE OS TIPOS PENAIS QUE CONSTITUEM OS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO. É OPORTUNO A SUA PUBLICAÇÃO, NO MOMENTO EM QUE O GRUPO “PORTA DOS FUNDOS” COMETE O CRIME DE VILIPÊNDIO, ESCÁRNIO E ZOMBARIA, NO QUAL ESCARNECE CONTRA AS RELIGIÕES CRISTÃES DO MUNDO. O MAIS LAMENTÁVEL É O APOIO QUE A MÍDIA DE VIÉS ESQUERDISTA VEM DANDO AO GRUPO, IGNORANDO OS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS QUE DEFINEM OS CRIMES CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO.
OS CRIMES
CONTRA O SENTIMENTO RELIGIOSO
A Constituição de 1988, em seu artigo quinto, inciso VI, dispõe “ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção de culto e suas liturgias”.
Dispõe o Código Penal, no artigo 208:
Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Parágrafo único - Se há emprego de violência, a pena é
aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.
Na Idade Média, os crimes contra o sentimento
religioso multiplicavam-se. O direito canônico impunha
penas leves, mas o “braço secular”, a serviço da Igreja, aplicava penas
terríveis e bárbaras, que, como bem lecionou Heleno Cláudio Fragoso(Lições de
direito penal, parte especial, 7ª edição, página 575), escreveu negra página na
história do direito penal. A blasfêmia era punida com o corte e a perfuração da
língua, a fustigação, o exílio, o cárcere e a morte.
Na lição de Nelson Hungria (Comentários ao código
penal, VIII, página 53), referindo-se a essa época, “as penas mais severas eram
editadas ad terrorem. O Estado, no sistema político unitário entre ele e a
Igreja Católica, fazia-se guardião dos desígnios de Deus na terra”. O pecado
confundia-se com o crime.
No direito penal moderno,
a partir do iluminismo, tem-se que a ideia não é mais outorgar proteção penal a
Deus ou à religião, mas, ao livre exercício do culto e ao sentimento religioso.
Porém, veja-se que o Código Penal de 1830
incriminava o culto de qualquer religião que
não fosse a do Estado (artigo 276) e a a propagação por meio de impressos ou
reuniões públicas, “de doutrinas que destruam as verdades fundamentais da
existência de Deus e da imortalidade da alma”.
Com a separação da Igreja
do Estado, o Código de 1890 incluía os crimes contra o livre exercício dos
cultos, estendendo a tutela penal a qualquer confissão religiosa.
Em verdade, a lei penal, com o vigente artigo 208,
assegura a liberdade individual no que concerne ao livre exercício dos cultos.
Tem-se em mira o sentimento religioso, como sentimento ético-social em si
mesmo, e, de forma secundaria, a liberdade de culto.
Crença é fé religiosa e função religiosa é o
ministério ou a incumbência de alguém de divulgar a religião (pastor, padre,
bispo, rabino etc.).
Ao contrário do Código Penal Suíço, o ordenamento
penal vigente não situa tais crimes contra a paz pública.
Como bem explicou Guilherme de Souza Nucci (Código
penal comentado, 8ª edição, página 852), trata-se de tipo penal que contém três
figuras criminosas autônomas, de modo que a prática de mais de uma implica na
punição por mais de um crime. Nessa linha de raciocínio, o agente poderá
responder, em concurso material, por escarnecer de alguém, por perturbar culto
e por vilipendiar objeto religioso.
Qualquer pessoa pode praticar esse crime. Quanto ao
sujeito passivo, há de existir alguma pessoa determinada que preencha o
elemento descrito “alguém”, como bem disse Guilherme de Souza Nucci (obra
citada, página 852), não sendo possível tratar-se de um grupo de pessoas
indeterminado. Mas traga-se, mais uma vez, a lição de Heleno Cláudio Fragoso
(obra citada, página 577), quando disse que “estes crimes violam diretamente
interesses coletivos, motivo pelo qual sujeito passivo deles é, primariamente,
o corpo social. Será sujeito passivo particular ou secundário, qualquer pessoa
física ou jurídica que sofrer a ação incriminada”.
Bem se diz que há casos em
que o crime não tem sujeito passivo particular.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo, o dolo
específico. É o ato de deboche voltado contra alguém, em público, por motivação
religiosa, objetivando desrespeitar o culto ou a função religiosa alheia.
Assim a zombaria há de ser feita em local público
ou de acesso público, pois a lei quer impedir que várias pessoas tomem
conhecimento da manifestação desairosa. Trata-se de circunstância especial da
conduta.
Especificamente com relação ao ultraje por motivo
de religião, que envolve, escarnecer (troçar, zombar, motejar) de alguém, por
motivo de crença ou de religião, tem-se que o achincalhe ou zombaria deve ser
motivado pelo fato da crença ou da função pública.
Repita-se que é indispensável que se trate de
escarnecimento público, praticado diante de várias pessoas ou por meio que o transmita
a várias pessoas (imprensa, internet etc.). Nesse tipo penal exige-se o dolo,
com especial motivação de agir de forma a ridicularizar ou fazê-lo em razão de
sua crença ou função religiosa.
Sendo assim o crime consuma-se sem qualquer outro
resultado e, em sendo verbal, não haverá tentativa, uma vez que se tratará de
crime unissubsistente. De toda sorte, é crime comum, formal, instantâneo. Se há
emprego de violência (física)
a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da pena corresponde à violência,
parágrafo único do artigo 208 do Código Penal.
Já se entendeu que quanto a esse crime, para
a sua configuração, é necessário que o escárnio seja dirigido à determinada
pessoa, sendo que a assertiva de que determinadas religiões traduzem
“possessões demoníacas” ou espíritos imundos”, espelham tão-somente posição
ideológica dogmática de crença religiosa (RJDTACr 23/374).
Quanto ao crime de impedimento de culto religioso,
tem-se que a ação física consiste em impedir (paralisar, suspender) ou
perturbar (alterar, atrapalhar) cerimônia ou prática religiosa, como é o caso
da missa ou qualquer outra cerimônia religiosa. É crime comum, formal. Basta o
dolo eventual sendo irrelevante o fim visado pelo agente (TACrSP, RT 491/318).
Por certo, Heleno Cláudio Fragoso (obra citada,
página 578) ensinou que “o que se protege aqui é o interesse ético-social do
sentimento religioso, o que exige que se trate de religião admitida pelo
Estado, com considerável número de adeptos e que não viole a ordem pública e os
bons costumes, tendo, pois, uma função ético-social a cumprir”.
Por fim, há o tipo envolvendo vilipêndio de ato ou
objeto de culto.
Vilipendiar é considerar como vil, desprezar ou
ultrajar injuriosamente. Isso é mais que ofender.
Para Heleno Cláudio Fragoso (obra citada, página 579), o tipo exige seja praticado publicamente, isto é, na presença de várias
pessoas. Assim o vilipêndio deve recair sobre ato (cerimônia ou a prática de
culto religioso) ou objetivo (qualquer coisa, bem corpóreo) de culto religioso.
O crime é comum, formal.
O crime se consuma com o vilipêndio e se for
verbal, não irá admitir tentativa. O elemento subjetivo é o dolo que exige a
ação desrespeitosa ou objetivamente ofensiva ao sentimento religioso praticada
com o fim de ultrajar e vilipendiar (dolo específico).
A causa de aumento é válida para as três figuras,
caso o autor empregue qualquer forma de violência(física).
Os crimes previstos no caput do artigo 208 do
Código Penal comportam transação penal e suspensão condicional do processo.
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